sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Gentil, a gentileza e a ilha

Ele foi a simplicidade, como é o povo. Ele foi a força e a garra, como é o brasileiro. Foi morada da alegria e, como o nome traz, da gentileza. Gentil Camilo do Nascimento Filho, ou melhor, Seu Gentil do Orocongo, fez história e continuará presente na cultura e na sonoridade desta ilha como um personagem singular.

A prova mais bonita da marcante presença deste senhor é que, no momento de seu sepultamento, a natureza também entristeceu. O céu escureceu, o mar se agitou, o vento abalou a ilha. O corpo, fragilizado pela idade e pela diabetes, foi enterrado no cemitério do Itacorubi, no final da tarde desta quinta-feira, 19. Seu espírito agora faz música e poesia alegrando outros seres.

Seu Gentil conheceu o Orocongo, instrumento de uma corda tocada com arco, ainda na infância. Os vizinhos, família originária de Cabo Verde, arquipélago africano, tocavam o instrumento pelo qual Gentil se apaixonou. Paixão que virou amor e que levou por toda sua vida de lutas pela sobrevivência. Foi pedreiro, vigilante, pescador, coisas da terra. Seu espírito sempre foi da arte, da música, do Orocongo.

Dedicou-se à essa musicalidade diferenciada e ao folclore da ilha de Santa Catarina. Tocava de ouvido as músicas do boi-de-mamão, ratoeiras, pau-de-fita, sambas e outros. Aprendeu a construir o instrumento e fez de tudo para divulga-lo. Era convidado para ministrar oficinas e palestras a respeito do monocórdio.

Tive a satisfação de conhece-lo em um desses eventos. Não aprendi a confecciona-lo mas aprendi a admirar a pessoa. Seu Gentil foi umas das atrações do Festival de Catarinense de Música do Sesc, em 2006, que também participei. Encantei-me por aquele senhor com roupas africanas, sozinho no palco do teatro do CIC, com seu orocongo animando a todos.

Tive a satisfação de encontra-lo pelas ruas de Florianópolis, de conversar com ele e ser testemunha da sua simplicidade, da sua garra, recebedor da sua gentileza, da sua paciência, e, principalmente, reconhecer nele não somente uma pessoa, mas um grande personagem da música e da cultura desta ilha, que é chamada de mágica, e se virou em feitiços para despedir-se de um de seus filhos.

Vida longa ao orocongo! Viva Seu Gentil!

Leandro Pellizzoni